segunda-feira, 2 de abril de 2012

Como resgatar o prazer da leitura?

Marcos Labanca/Gazeta do Povo
Marcos Labanca/Gazeta do Povo / O estudante Stênio Fornari, de 14 anos, gosta de ler biografias e baixar livros pela internet: ele leu dez obras no ano passado 
 O estudante Stênio Fornari, de 14 anos, gosta de ler biografias e baixar livros pela internet: ele leu dez obras no ano passado


Pesquisa revela que brasileiros leem cada vez menos. Para especialistas, faltam campanhas de incentivo à leitura para virar esse jogo

Projetos
Iniciativas públicas e ONGs tentam aproximar leitores e livros
Por meio de iniciativas públicas e não-governamentais, o país tenta caminhar para superar as dificuldades de leitura. O Programa Nacional de Incentivo à Leitura (Proler) é o mais antigo projeto em vigor – completa 20 anos de existência neste ano. São 74 comitês espalhados em todas as regiões do país cuja finalidade é formar mediadores, bibliotecas comunitárias e melhorar a qualidade das bibliotecas existentes.
No Paraná, ano passado, foi lançado o Plano Estadual do Livro. Apesar de ainda não ter se tornado lei, o plano já resultou em ações práticas. São oficinas de criação literária e o projeto Um Escritor na Biblioteca, com nomes da literatura contemporânea – atividades realizadas na Biblioteca Pública do Paraná, em Curitiba. No segundo semestre deste ano, estão previstas atividades nas cidades do interior, segundo o governo do estado.
Estímulo ao prazer
Há também ações feitas por universidades e ONGs. Em Foz do Iguaçu, a ONG Guatá – Cultura em Movimento trabalha com o projeto Tirando de Letra, que incentiva a leitura por métodos não-convencionais em escolas, ruas e praças. Mediadores promovem leituras, debates e diálogos entre os participantes. Nas ações, os próprios alunos escolhem as obras a serem lidas e são surpreendidos por exercícios que os aproximam da escrita e da leitura. Histórias são contadas coletivamente e a leitura é mistura à oralidade. O propósito é estimular o prazer da leitura. “É uma troca de conhecimento e experiência não é o ‘saber’ contra a falta de leitura”, diz Silvio Campana, um dos coordenadores do projeto.
“Ler é essencial, é puro conhecimento”
Fabiula Wurmeister, da sucursal
“Como seria bom se todo mundo lesse! Ler é essencial, é puro conhecimento.” A definição é do estudante Stênio Fornari, de 14 anos, do 1.º ano do curso de magistério do Colégio Estadual Barão do Rio Branco, em Foz do Iguaçu. O hábito da leitura, apesar de ter começado logo cedo, ainda nos primeiros anos de alfabetização, foi deixado de lado no final do ensino fundamental, por falta de estímulo, lembra. Há cerca de dois anos, voltou a ler com frequência.
Entre os livros preferidos, as biografias. “Elas retratam a vida das pessoas. Gosto de saber como as personalidades, principalmente os meus ídolos, viveram e o que fizeram para chegar até onde chegaram. É uma forma de buscar alguns bons exemplos.” Nos livros de literatura ou nos títulos que lê a pedido dos professores, diz colher lições de vida e práticas de cidadania. “Uma delas é sempre ajudar os amigos e ser uma pessoa boa.”
O gosto pela internet o aproximou ainda mais da leitura. “Os dois livros que estou lendo agora baixei da internet. Faço o mesmo quando um professor indica um ou dois capítulos de um livro para discussão em sala de aula. Acabo baixando e lendo o livro todo.” Quando os estudos dão uma folga, aproveita para “ler por prazer”. No ano passado, leu dez livros, bem acima da média nacional.
A influência que recebe na escola e em projetos de incentivo à leitura começa a render frutos em casa. “Estou fazendo com o meu irmão mais novo, de seis anos, o mesmo que meu pai fazia quando eu tinha a idade dele. Sempre que posso, trago algum gibi. Ele lê para mim e, se tem dificuldade, leio para ele. E a gente fica conversando sobre o que lê. É muito gratificante”, comemora.

Metade dos brasileiros declara não ler por falta de tempo e outros 30% dizem não gostar de livros. Os dados, da pesquisa Retratos da Leitura, evidenciam o tamanho do desafio que é estimular esse hábito no Brasil. Para educadores e escritores, o problema é que ler deixou de ser uma prioridade na vida das pessoas.
O índice de leitura do brasileiro (quatro livros por ano em média – dos quais 2,1 livros são lidos inteiros e dois em partes) é baixo se comparado a outros países desenvolvidos ou em desenvolvimento. Os franceses leem em média sete livros ao ano, os chilenos 5,4 e os argentinos 4,6. A meta do governo é fazer com que a população leia pelo menos dez obras ao ano.
Poeta e professor aposentado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Alcides Buss diz que no Brasil não há leitura como passatempo, ao contrário de outros países. Para ele, o cenário é ainda pior do que o apontado pela pesquisa, que leva em conta livros didáticos e paradidáticos. “Se chegarmos a este patamar de quatro livros ao ano será fantástico”, diz.
Para mudar essa realidade, Buss sugere fazer campanhas nacionais de incentivo à leitura e valorizar os autores brasileiros. “Nos últimos anos, o foco está muito em cima dos best-sellers. Os nossos autores ficaram em segundo plano”, afirma. “Também é preciso baratear o preço dos livros e tornar as bibliotecas mais dinâmicas”, completa.
Professor da Universidade Estadual de Campinas (Uni­camp), Ezequiel Theodoro da Silva considera que o país acumula uma dívida imensa com a promoção da leitura, por isso, hoje há múltiplas e imensas barreiras para os brasileiros lerem mais. “A política atual privilegia muito mais a produção e distribuição de livros, satisfazendo os editores, mas pouco contempla a leitura. Quer dizer, temos livros, mas não mediadores e a infraestrutura de que eles necessitam para formar leitores”, analisa.
Para ele, as bibliotecas brasileiras, com raras exceções, fazem um trabalho muito tímido de divulgação e não atingem as diferentes camadas da população.

Valorização

Envolver a sociedade em campanhas de leitura é um caminho para valorizar o livro, diz a professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Marta Morais da Costa, que faz parte da Cátedra da Unesco de Leitura. Ela afirma que a leitura é uma responsabilidade da sociedade – escola, família, igreja e empresas. Inúmeras ações precisam ser tomadas para transformar a realidade, inclusive, cobrar leituras de qualidade em concursos públicos e promover mais o livro na mídia.
Carmem Pimentel, coordenadora nacional do Programa Nacional de Incentivo à Leitura (Proler), do governo federal, concorda que o estímulo à leitura precisa partir da família e da escola, mas aponta outro problema: “Os professores não são leitores. Como eles vão estimular os alunos?”.
Denise Paro, da sucursal / Foto: Marcos Labanca/ Gazeta do Povo.

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