Marcos Labanca/ Gazeta do Povo
Preservação de matas ciliares faz parte do programa: atualmente são 15.400 educadores em 130 microbacias hidrográficas
Implantado há dez anos na Bacia do Paraná, o
Cultivando Água Boa é referência mundial na união entre conhecimento,
compromisso e ação.
“A
terra tem vida.” A afirmação faz brilhar os olhos do agricultor Valmir
Anderle e também contagia a família, vizinhos e centenas de pequenos e
médios produtores rurais de 29 municípios localizados na Bacia do Paraná
3, área de 8 mil km² às margens do Lago de Itaipu, no Oeste do estado. A
frase repetida pelo teólogo Leonardo Boff em vários encontros com as
comunidades ribeirinhas dá o tom às dezenas de ações de preservação
ambiental desenvolvidas na região por meio do Programa Cultivando Água
Boa, que neste ano completa uma década.
Idealizado e colocado em prática com a ajuda de parceiros como a Itaipu Binacional, universidades, organizações não governamentais, associações, cooperativas e prefeituras, o projeto conta com uma série de princípios extraídos de documentos voltados à proteção do meio ambiente e da vida, como a Carta da Terra, a Agenda 21 e os Desafios do Milênio. Pensadores como Edgar Morin, Fritjof Capra, Paulo Freire, Enrique Leff e James Lovelock completam a base teórica do programa referência em gestão ambiental e sustentabilidade.
Prática
Com base nos livros, as ideias são compartilhadas em “Oficinas do Futuro.” E aí, lamentos, sugestões e compromissos formam um diagnóstico participativo que serve de termômetro para as ações. “Na sensibilização, trabalhamos conceitos, valores e metodologias. Tudo isso ligado às consequências do descuido com o meio ambiente na vida prática das pessoas”, explica o coordenador, “pai, mãe e filho” do programa, Nelton Friedrich. O planejamento estratégico ajuda a avaliar e corrigir os erros que surgem pelo caminho. “Todos são atores”, completa.
A forma de gestão adotada também permite mudanças. “Desde a idealização, muita coisa mudou. Em algumas, erramos. Em outras, acertamos a ponto de ter de ampliá-las. Isso faz do Cultivando Água Boa um programa vivo”, destaca Friedrich. A chave para esse sucesso, diz, está na educação ambiental e nas parcerias. Criado para resolver um problema que com o tempo poderia inviabilizar a produção de energia pela Hidrelétrica de Itaipu – a quantidade de terra carregada dos vários mananciais para o reservatório –, o programa tem servido de modelo para outras usinas como a de Yaciretá, binacional paraguaia e argentina. “A recuperação dessas áreas possibilitou uma mudança de vida que ainda e que, sem dúvida alguma, pode ser empregada em qualquer parte do planeta”, aponta o coordenador ao destacar a liberdade como principal produto do Cultivando Água Boa.
Atuação
Os 20 programas e 65 ações que formam o Programa Cultivando Água Boa incentivam a agricultura familiar e a sustentabilidade. Produtores e pecuaristas formam uma rede em uma área onde vivem mais de 1 milhão de pessoas. Veja alguns exemplos e depoimentos que ajudam a dimensionar os efeitos desse modelo de gestão ambiental que existe desde 2003.
Energias Renováveis
O pecuarista Pedro Rigelmeier (foto 1) e Eldo Matte integram com outros 31 criadores de Marechal Cândido Rondon o Condomínio de Agroenergia Ajuricaba, primeiro no país a produzir energia elétrica com o biogás gerado da fermentação de dejetos animais. “Depois disso, a gente nem pensou mais em morar na cidade”, revela a esposa de Eldo, Helmi Matte. O condomínio deve garantir uma renda de R$ 270 mil anuais com a produção de energia térmica, elétrica, veicular e biofertilizantes.
Corredor da biodiversidade
Com 70 metros de largura, o cinturão verde liga o Parque Nacional do Iguaçu ao de Ilha Grande, na divisa entre o Paraná e Mato Grosso do Sul. A ideia é permitir o fluxo genético da flora e da fauna regionais. Entre os municípios de Santa Terezinha de Itaipu e São Miguel do Iguaçu, o corredor recebeu um reforço de 240 hectares da Reserva Particular de Patrimônio Natural (RPPN) da Fazenda Santa Maria. Assim que estiver completamente formado, poderá ser estendido aos parques estaduais do Turvo (RS) e do Morro do Diabo (SP).
Cultivo de orgânicos
Noventa salários mínimos. Esse foi o rendimento do agricultor Valmir Anderle com o cultivo de frutas, legumes e verduras orgânicas em uma área equivalente a um pouco mais de dois campos de futebol em Pato Bragado. “A próxima tendência na alimentação mundial será as frutas”, profetiza o ex-sojeiro. Batata-doce, banana, tomate e uva, o xodó, saem direto da plantação para a mesa da família, mercados da região e servem como ajuda extra para complementar a merenda escolar da rede municipal de ensino. “A agricultura orgânica transformou nossas vidas. Consegui formar duas filhas”, comemora.
Tanques-Rede
Com seis anos de profissão, o pescador Estevão de Souza (foto 2) não pensa em voltar à pesca tradicional. “Desse jeito, com organização igual à de qualquer indústria, posso ter peixe o ano todo”, compara. Colhendo os bons resultados da iniciativa, pretende ampliar o número de espécies e construir o próprio laboratório de reprodução. “A gente vai aprendendo, e com um pouco mais de conhecimento, já pensa em andar sozinho.” Os mais de 700 tanques-rede espalhados pelo Lago de Itaipu têm capacidade para produzir 6 mil toneladas de peixe por ano.
Recuperação da mata ciliar
A barreira natural que hoje margeia milhares de quilômetros do Lago de Itaipu e de seus afluentes do lado brasileiro teve o importante reforço de 24 milhões de árvores plantadas, grande parte delas nos últimos dez anos. Além de impedir a circulação do gado e o assoreamento dos rios, a recuperação da flora local também trouxe de volta abelhas nativas, entre outras espécies.
Plantas Medicinais
Ex-produtora de fumo, Guiomar Neves (foto 3) quase morreu intoxicada com agrotóxicos que aplicava na lavoura. Hoje preside uma cooperativa de produtores orgânicos com sede em Santa Tereza do Oeste e exibe o sorriso de quem encontrou no trabalho qualidade de vida e renda. “Sou feliz com o que faço. Isso sem falar que médico e hospital agora é só para prevenção.”
Fabiula Wurmeister, da sucursal / Fotos Marcos Labanca/Gazeta do Povo
Idealizado e colocado em prática com a ajuda de parceiros como a Itaipu Binacional, universidades, organizações não governamentais, associações, cooperativas e prefeituras, o projeto conta com uma série de princípios extraídos de documentos voltados à proteção do meio ambiente e da vida, como a Carta da Terra, a Agenda 21 e os Desafios do Milênio. Pensadores como Edgar Morin, Fritjof Capra, Paulo Freire, Enrique Leff e James Lovelock completam a base teórica do programa referência em gestão ambiental e sustentabilidade.
Prática
Com base nos livros, as ideias são compartilhadas em “Oficinas do Futuro.” E aí, lamentos, sugestões e compromissos formam um diagnóstico participativo que serve de termômetro para as ações. “Na sensibilização, trabalhamos conceitos, valores e metodologias. Tudo isso ligado às consequências do descuido com o meio ambiente na vida prática das pessoas”, explica o coordenador, “pai, mãe e filho” do programa, Nelton Friedrich. O planejamento estratégico ajuda a avaliar e corrigir os erros que surgem pelo caminho. “Todos são atores”, completa.
A forma de gestão adotada também permite mudanças. “Desde a idealização, muita coisa mudou. Em algumas, erramos. Em outras, acertamos a ponto de ter de ampliá-las. Isso faz do Cultivando Água Boa um programa vivo”, destaca Friedrich. A chave para esse sucesso, diz, está na educação ambiental e nas parcerias. Criado para resolver um problema que com o tempo poderia inviabilizar a produção de energia pela Hidrelétrica de Itaipu – a quantidade de terra carregada dos vários mananciais para o reservatório –, o programa tem servido de modelo para outras usinas como a de Yaciretá, binacional paraguaia e argentina. “A recuperação dessas áreas possibilitou uma mudança de vida que ainda e que, sem dúvida alguma, pode ser empregada em qualquer parte do planeta”, aponta o coordenador ao destacar a liberdade como principal produto do Cultivando Água Boa.
Atuação
Os 20 programas e 65 ações que formam o Programa Cultivando Água Boa incentivam a agricultura familiar e a sustentabilidade. Produtores e pecuaristas formam uma rede em uma área onde vivem mais de 1 milhão de pessoas. Veja alguns exemplos e depoimentos que ajudam a dimensionar os efeitos desse modelo de gestão ambiental que existe desde 2003.
Energias Renováveis
O pecuarista Pedro Rigelmeier (foto 1) e Eldo Matte integram com outros 31 criadores de Marechal Cândido Rondon o Condomínio de Agroenergia Ajuricaba, primeiro no país a produzir energia elétrica com o biogás gerado da fermentação de dejetos animais. “Depois disso, a gente nem pensou mais em morar na cidade”, revela a esposa de Eldo, Helmi Matte. O condomínio deve garantir uma renda de R$ 270 mil anuais com a produção de energia térmica, elétrica, veicular e biofertilizantes.
Corredor da biodiversidade
Com 70 metros de largura, o cinturão verde liga o Parque Nacional do Iguaçu ao de Ilha Grande, na divisa entre o Paraná e Mato Grosso do Sul. A ideia é permitir o fluxo genético da flora e da fauna regionais. Entre os municípios de Santa Terezinha de Itaipu e São Miguel do Iguaçu, o corredor recebeu um reforço de 240 hectares da Reserva Particular de Patrimônio Natural (RPPN) da Fazenda Santa Maria. Assim que estiver completamente formado, poderá ser estendido aos parques estaduais do Turvo (RS) e do Morro do Diabo (SP).
Cultivo de orgânicos
Noventa salários mínimos. Esse foi o rendimento do agricultor Valmir Anderle com o cultivo de frutas, legumes e verduras orgânicas em uma área equivalente a um pouco mais de dois campos de futebol em Pato Bragado. “A próxima tendência na alimentação mundial será as frutas”, profetiza o ex-sojeiro. Batata-doce, banana, tomate e uva, o xodó, saem direto da plantação para a mesa da família, mercados da região e servem como ajuda extra para complementar a merenda escolar da rede municipal de ensino. “A agricultura orgânica transformou nossas vidas. Consegui formar duas filhas”, comemora.
Tanques-Rede
Com seis anos de profissão, o pescador Estevão de Souza (foto 2) não pensa em voltar à pesca tradicional. “Desse jeito, com organização igual à de qualquer indústria, posso ter peixe o ano todo”, compara. Colhendo os bons resultados da iniciativa, pretende ampliar o número de espécies e construir o próprio laboratório de reprodução. “A gente vai aprendendo, e com um pouco mais de conhecimento, já pensa em andar sozinho.” Os mais de 700 tanques-rede espalhados pelo Lago de Itaipu têm capacidade para produzir 6 mil toneladas de peixe por ano.
Recuperação da mata ciliar
A barreira natural que hoje margeia milhares de quilômetros do Lago de Itaipu e de seus afluentes do lado brasileiro teve o importante reforço de 24 milhões de árvores plantadas, grande parte delas nos últimos dez anos. Além de impedir a circulação do gado e o assoreamento dos rios, a recuperação da flora local também trouxe de volta abelhas nativas, entre outras espécies.
Plantas Medicinais
Ex-produtora de fumo, Guiomar Neves (foto 3) quase morreu intoxicada com agrotóxicos que aplicava na lavoura. Hoje preside uma cooperativa de produtores orgânicos com sede em Santa Tereza do Oeste e exibe o sorriso de quem encontrou no trabalho qualidade de vida e renda. “Sou feliz com o que faço. Isso sem falar que médico e hospital agora é só para prevenção.”
Fabiula Wurmeister, da sucursal / Fotos Marcos Labanca/Gazeta do Povo
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