quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Uma união entre oviedistas e liberais ameaça o favoritismo dos colorados


Marcos Labanca/Gazeta do Povo
Marcos Labanca/Gazeta do Povo / Centenas de pessoas comparecem ao velório de Lino Oviedo, cuja morte deixa em aberto o cenário político no país  
Centenas de pessoas comparecem ao velório de Lino Oviedo, cuja morte deixa em aberto o cenário político no país


Morte de Oviedo pode levar à aliança entre a Unace e o partido do atual presidente; aproximação ficou evidente no velório do ex-general


 
A morte do ex-general Lino César Oviedo, 69 anos, alterou o panorama político do Paraguai para as eleições presidenciais. A pouco mais de dois meses para a corrida presidencial, os holofotes se voltam para a União Nacional dos Cidadãos Éticos (Unace), partido criado por Oviedo.
Marcos Labanca/Gazeta do Povo
Marcos Labanca/Gazeta do Povo / Homem cobre a cabeça com panfleto político de Oviedo 
Homem cobre a cabeça com panfleto político de Oviedo
Entrevista Oviedo administrava o partido “como se fosse um quartel”
Alfredo Boccia, analista político
Lino Oviedo tinha fama de golpista, mas era também reconhecido pela sua liderança e inteligência administrativa. Nesta entrevista, o analista político Alfredo Boccia comenta a história de Oviedo e o que representa a morte dele para o país.
O que significa a morte de Oviedo para o Paraguai e para a Unace?
É uma comoção como seria em qualquer parte do mundo a morte de um candidato faltando dois meses para as eleições. Mas é uma comoção limitada porque não influi na institucionalidade democrática. Sem Oviedo, a União Nacional dos Cidadãos Éticos (Unace) não tem graça, ele era um líder personalista. Além disso, nos últimos anos, Oviedo brigou com dirigentes importantes e foi preenchendo espaços vazios com familiares. O partido chegou no ápice em 1998, quando Oviedo poderia ser presidente, mas judicialmente foi impedido. Depois, foi acusado de envolvimento na morte do vice-presidente Luis María Arganã, saiu do país, foi preso e ficou fora por quase uma década. Ele voltou e em 2008, foi candidato, mas sem ser bem votado porque seu peso político já era menor.
Oviedo criou uma gestão assistencialista na Unace, um partido com uma sede suntuosa, que oferece atendimentos médicos, odontológicos e cursos. Isto tem relação com a personalidade dele?
Ele administrava o partido como se fosse um quartel. Oviedo tinha virtudes, era um líder. Tinha carisma que caía muito bem entre as classes populares baixas que, em geral, são nostálgicas. É preciso relembrar. O Paraguai tem uma história de militarismo e autoritarismo enorme – são 200 anos. Nossos primeiros 24 anos de democracia são esses. E há muita gente que gosta disso, de um líder patriarcal que dê ordens. O Paraguai é um país de uma matriz social das mais conservadoras do continente, comparável só com Honduras. Aqui não tem esquerda, por isso a eleição de Fernando Lugo foi um “momento de loucura da natureza”. Então, Oviedo caía bem, mas para uma porcentagem cada vez mais pequena da população e mais velha. Ele estava eleitoralmente em decadência e não haveria ninguém interessado em matá-lo.
De que forma Oviedo conseguia manter a estrutura assistencialista do partido?
Boa pergunta porque aí está o mistério de Lino Oviedo. Esse senhor alcançou toda sua fama em ser libertador do Paraguai. Ele participou do golpe que derrubou [o ditador Alfredo] Stroessner e fez uma autopromoção. Ninguém nega seu protagonismo no golpe, mas não podemos nos esquecer de que, nos 20 anos anteriores, ele era tenente ao lado do general Andrés Rodríguez e se enriqueceu com todas as coisas que enriqueceram Rodríguez: narcotráfico e contrabando, pistas clandestinas, negócios de fronteira. Ele era o financeiro, o gerente de Rodríguez. Os dois deram golpe no Stroessner e ficaram mais ricos porque sacavam dos stroessnistas, à ponta de pistola, casas, canais de televisão, fazendas. E assim terminaram com vinícolas, aviões. Foi um saque.
E ninguém questionava esses saques?
Não, porque todos estavam felizes. Foram perdoados porque estavam saqueando os ditadores. A fortuna de Oviedo é impossível de ser calculada, mas ele vivia, em teoria, desde 1996 com seu salário de general retirado. Independentemente disso, ele tinha uma virtude enquanto administrador. O que é injustificável é que um general retirado tenha tanto dinheiro. Ele que nos trouxe a democracia era o último militar paraguaio que tentou quebrar a democracia três ou quatro vezes. Tudo nele é meteórico. Começa em 2 de fevereiro de 1989 com a deposição de Stroessner e morre em 2 de fevereiro, 24 anos depois. É um caudilho típico do final do século 20 e do começo do século 21 que foi a curiossísima e contraditória transição paraguaia.
Com a saída de cena do líder, a Unace fica enfraquecida, mas pode ameaçar o favoritismo do Partido Colorado caso sele uma possível aliança com o Partido Liberal Radical Autêntico (PLRA), do atual presidente Federico Franco.
A aproximação entre liberais e oviedistas ficou evidente durante o velório e o funeral do ex-general, acompanhado pelo presidente Federico Franco e o presidente do PLRA, Blas Llano. Após as cerimônias fúnebres, as negociações avançaram. Nesta semana, liberais confirmaram que há possibilidades de mudança na chapa eleitoral. O vice-candidato à presidente na chapa liberal, Rafael Filizolla, do Partido Democrático Progressista (PDP) poderá ser substituído por um oviedista caso a aliança tenha sucesso. O prazo para o registro das chapas termina na sexta-feira, dia 15. O mais cotado para ocupar o posto é o deputado Ariel Oviedo, 34 anos, filho do ex-general.
É consenso entre os analistas políticos que a Unace irá perder votos caso decida manter chapa própria porque Oviedo não preparou um sucessor e não há no partido alguém que reúna a força e o carisma que ele tinha. “A liderança de Oviedo era carismática. Não era institucional ou em torno de uma organização ou partido”, diz o sociólogo da Universidade Católica de Assunção (UCA), José Nicolás Morínigo.
No entanto, a incógnita gira em torno de qual candidato se beneficiou mais com a saída abrupta do ex-general da cena política. Oviedo, segundo Morínigo, assegurava entre 12% e 13% do eleitorado e teria poucas chances de vencer as eleições, que ficaria polarizada entre o colorado Horácio Cartes e o liberal Efraín Alegre. As eleições estão marcadas para o dia 21 de abril.
Migração
Para o analista José Carlos Rodríguez, é provável que a maioria dos votos da Unace migrem para o Partido Colorado caso não haja uma aliança explícita entre oviedistas e liberais. A tendência justifica-se porque a Unace nasceu com um movimento liderado por Oviedo dentro do Partido Colorado, do qual fazia parte.
Na avaliação de Rodríguez, a possível aliança com os oviedistas melhora, sem dúvida, a posição dos liberais, mas é difícil determinar o quanto.
“A aliança liberal oviedista pode ter um custo negativo entre o eleitorado liberal e não liberal. Logo pode se perder votos úteis dos anticolorados e anticartistas”, explica.
Cartes
As mais recentes intenções de voto, divulgadas antes da morte de Oviedo, colocam Horácio Cartes na frente dos liberais, com uma margem pequena de 6%. Os colorados, que ficaram seis décadas no poder, lutam para retornar à presidência, após serem desbancados pelo ex-bispo Fernando Lugo, destituído do posto em junho do ano passado depois de impeachment decretado em 48 horas.
Sede da Unace é um templo oviedista
Com uma área de dois hectares, a sede da União Nacional dos Cidadãos Éticos (Unace), em San Lorenzo, região metropolitana de Assunção, mais parece um templo oviedista. Painéis com fotos gigantes do ex-general estão espalhados por toda parte. Na Unace, os filiados recebem uma carteirinha e podem frequentar cursos e conseguir, gratuitamente, consultas com médicos e dentistas.
Para a corrida presidencial, a Unace distribuiu, por todo país, 1,2 mil motocicletas e 150 motos acopladas a minicarretas. Pequenos caminhões cegonhas fazem as motos chegarem a inúmeras cidades do interior paraguaio. Tudo tem propaganda com imagens de Oviedo. Partidários também exigem celulares com jingles da campanha, DVDs, revistas e bolsas.
Os dirigentes da Unace alegam que o dinheiro para bancar a estrutura vem da Justiça Eleitoral, que repassa dinheiro aos partidos, conforme o número de representantes. No entanto, analistas questionam que a Unace é a terceira força do país e não tem um peso eleitoral suficiente para manter a estrutura do partido.
Segurança de um estacionamento em Assunção, Alcides Acosta, 43 anos, exibe uma carteirinha da Unace. Ele frequenta o partido para buscar remédios e consultar dentista. “Oviedo era a única pessoa que se preocupava com os pobres”.

  Denise Paro, enviada especial / Fotos Marcos Labanca /Gazeta do Povo.

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